O que pode haver de comum entre Affonso Eduardo Reidy, o PAC – Programa da Aceleração do Crescimento e o PAN?
Para início de conversa, Reidy, considerado um dos pioneiros na introdução da arquitetura moderna no país “praticava uma arquitetura discreta e nada preocupada em deixar marcas ou criar impacto”, conforme cita Edson da Cunha Mahfuz em seu artigo “The importance of being reidy”. Contemporâneo de Niemeyer e Lucio Costa, Reidy por muito tempo esteve relegado ao esquecimento, e somente agora vem tendo seu trabalho reconhecido. Ele “entendia a habitação como uma questão social e propunha a reestruturação urbana e a construção de núcleos habitacionais populares”. Baseado nesse conceito projetou, entre 1946 e 1952, os conjuntos habitacionais do Pedregulho, em São Cristóvão, e o da Gávea, conhecido como Minhocão. Investiu em projetos que tivessem função social e se integrassem com harmonia à paisagem natural.
Minha motivação pelo tema se deve ao documentário Lembranças do Futuro (2006, 27 min., direção de Ana Maria Magalhães e direção de fotografia do arquiteto Mário Carneiro), sobre o arquiteto francês naturalizado brasileiro Affonso Eduardo Reidy.
São dele alguns dos projetos mais conhecidos desta cidade (Rio de Janeiro), como o Conjunto Residencial Pedregulho (Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes, projeto de 1946), projetado para abrigar funcionários públicos do então Distrito Federal; o Conjunto da Gávea (Unidade Residencial da Gávea, Marquês de São Vicente, de 1952); o Museu de Arte Moderna e o Teatro Armando Gonzaga (Marechal Hermes, 1950), mas minha surpresa foi maior ao conhecer a abrangência destes projetos. Não se trata da simples construção de edifícios: Reidy foi responsável pelos serviços de arquitetura e urbanismo da prefeitura do Rio de janeiro a partir de 1932. Nos conjuntos residenciais populares construídos entre as décadas de 1930 e 1950 estava incutida a idéia de ordenamento das relações sociais através da vida comunitária. Porém...
O projeto do Conjunto Habitacional da Gávea foi “mutilado pela construção do Túnel Zuzu Angel”. Nos terrenos da PUC-RJ ficava o Parque Proletário da Gávea, criado na década de 1940 e removido em 1970; seus moradores foram levados para a Cidade Deus. Parques proletários (construídos três entre 1942 e 1943, abrigando mais de 5 mil pessoas) eram áreas destinadas ao abrigo temporário de moradores de favelas que seriam urbanizadas (vale a pena ler mais no site “Favela tem Memória”); a PUC “construiu seu campus de forma a inviabilizar a Auto-Estrada Lagoa-Barra e a expansão do Parque Proletário, e acabou ficando com um pedaço do terreno que seria usado pelo conjunto”.
O Conjunto Habitacional Pedregulho, considerado arrojado pela sua concepção espacial e pela prioridade dada aos equipamentos de lazer e convivência, foi construído na sua totalidade, porém sofre a falta de continuidade de investimentos na região. “O conjunto do Pedregulho traz em sua concepção (...) a relação entre habitação social, modernização, educação popular e transformação da sociedade, objetivos que nos nossos dias são postos em questão”.
Um plano diretor objetiva “fazer com que a propriedade urbana cumpra com sua função social, entendida como o atendimento do interesse coletivo em primeiro lugar, em detrimento do interesse individual ou de grupos específicos da sociedade. O alvo de um plano diretor é fazer a vida urbana mais confortável, aproveitável, segura, além de fornecer um terreno propício ao crescimento econômico da cidade.”
O PAN: Projetos urbanísticos e sociais importantes estavam atrelados aos jogos Pan-Americanos do Rio em 2007, como o “entorno” do Engenhão, as obras de tratamento de esgoto na baixada de Jacarepaguá, com saída no emissário da Barra, e a vila do PAN, cujos apartamentos “já estavam todos vendidos” e até agora moram lá somente meia dúzia de gatos pingados. Muito do que foi prometido pelas autoridades e, pior, divulgado pela imprensa, foi relegado ao abandono após a realização dos jogos.
A história mostra que grandes projetos – no caso o desenvolvimento urbano - geralmente ficam incompletos em função dos interesses econômicos e ou políticos dos grupos sociais para os quais trabalham os planejadores (aqui, os arquitetos e urbanistas). O que esperar do PAC, então? Ninguém se iluda: mais um projeto incompleto ou que não terá continuidade no futuro; mais e maiores problemas sociais à vista. Deus queira que eu esteja errado...
Fontes:
http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arquitextos.asp
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm
http://fotolog.terra.com.br/sdorio
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